segunda-feira, 15 de junho de 2009

Vida de professor

Nas minhas correções de exames simulados da área de Humanas do ensino médio, estou inesgotavelmente cercado de uma fonte que borbulha maravilhas da construção textual de nossos jovens. Gosto de me prender aos desafios de tentar desvendar, entender, talvez traduzir, as respostas, que não dão respostas, produzidas por esses estudantes.
Apresento, a seguir, o primeiro caso que decidi registrar. Nele é possível observar um belíssimo enchimento de linguiça quando o aluno ao se deparar com uma questão de Filosofia, que versava sobre os tipos de verdade, lapida esta pérola:

"Toda verdade é verdade, né verdade? Então levando em conta tudo isso, agora penso eu que a verdade não pode ser nada mais do que a própria verdade. Mesmo que a verdade não seja verdade, aí ela seria uma não verdade, ou seja, mentira. Mentira é o contrário da verdade, onde com a mentira buscamos esconder a verdade para nos livrar de alguma coisa. Né verdade? Ou eu tô mentindo? Ou seja, tudo que eu falei tem razão, se tem razão Tomás de Aquino também tem razão, né não? Com todos esses pensares, Totó (Tomás de Aquino) ele harmonizou a verdade da fé com as verdades da razão natural, a partir de um único princípio, que foi a verdade. Chegando à conclusão de que sempre devemos dizer, falar, dialogar, conversar, hablar, speak, somente a verdade."

Eu li, viu?
É verdade, meu jovem!

O outro caso vem de uma prova de História que pedia para explicar como os negros ainda neste milênio sofrem segregação racial. Este aluno, observe, promove uma segregação através de sua (des)comunicação.

"Pelo fator da cor na aparência do local (com todo mundo branco dá impressão de lugar mais de elite). Por capacidade mental não lhe são dados cargos importantes (superiores) aos que lhe são oferecidos (aos negros)."

Tento desvendar. "Pelo fator da cor na aparência do local (...)", a pergunta era sobre segregação racial ou sobre decoração de ambientes? "Por capacidade mental (...)", a pergunta era sobre segregação racial ou sobre segregação por incapacidade, invalidez?

Neste mesmo colégio onde exerço essa função de examinador, claro que instituição e alunos ficarão aqui anônimos, aconteceu o próximo caso a ser apresentado. Uma questão de História pedia para o aluno descrever as principais reformas realizadas em Atenas pelo legislador Solon. Este aluno me vem com a seguinte resposta dissertada:

"Solon fez muita coisa em Atenas a favor dos que não tinham direito e beneficiou muita gente. Só que não deu futuro lá aí veio dar aula de matemática no Colégio X."

Detalhe, "Colégio X", que aqui neste texto substitui a expressão original da resposta do aluno, é o colégio onde trabalho, e lá tem um professor de Matemática chamado Solon.
Solon, meu amigo, por que deixaste a área de legislação grega para singelamente lecionar Matemática por esses trópicos de cá? Não entendo.
É... esta é a vida de professor. É a lida de professor.

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