terça-feira, 29 de novembro de 2016

ESCOLHIDO PARA SERVIR ou POEMA DE NATAL

O escolhido foi gestado
entretanto não nasceu
foi escolhido para servir
mas não se desenvolveu

Não conheço linhas tortas
nem sei escrever certo
do amor seria servo
e estaria hoje bem perto

A certeza de ser o escolhido –
Neo, the one – é minha
mas nada mudaria se não o fosse
e fosse simplesmente La niña

Fenômeno que resfria a superfície
mas aquece a profundeza
conheço as consequências
e para o cárdio são uma beleza

De natal e de vitória
“o espetáculo da vida”
abatida, que agora chora
mas um dia será lida

Vida que segue interrompida
casa nova que vem, não vem...
É possível ver uma saída
coragem, porém...

Entre rimas e vidas pobres
um gado adulto a pastar
ruminando os podres
não está o escolhido, star

Ao olhar para esta
teus caramelos brilharão
darão à luz uma nova era
Era nova uma luz clarão

sexta-feira, 25 de novembro de 2016

Repenet

Quem acompanha o rap nacional sabe que tá rolando uma chacoalhada no gênero com as tais diss. Cá não estou me opondo nem apoiando. Acho uma discussão importante a se travar. Há pontos positivos e negativos. As batalhas são boas para elevar o nível, assim como acontecem nos repentes e cordéis que há muito já as faziam, mas no rap nem sempre são amistosas como no repente, que sempre são. Eu mesmo posso dizer que já fiz uma diss, foi no meu disco Pau-Brasil, em 2009, última faixa: U.N.I.D.A.D.E. “Disseram que o meu som não era rap, com segregação o movimento não cresce”; naquela ocasião fui acusado (?) de não contribuir para o rap, de ser playboy, de não falar a língua da periferia etc. Porra! E é uma religião, é? Eu falo a ‘Língua geral’. Tudo bem pra você, bispo? Aproveitando esse ensejo amistoso (rsrs), eu acredito que o papo se encerra aqui. Uma diss para si mesmo. Tey! Confesso que nunca achei Rashid o mais foda das rimas, mas agora, para mim – que sou este não contribuinte playboy não falante da língua da periferia (entretanto falante da linguagem dela) –, ele se apresenta como um muito foda da lírica. Assim como um parceiro meu me disse a respeito da minha diss lá em 2009, digo hoje que Rashid deu um soco na cara com uma luva de plumas, ou seja, com elegância. E a literatura, mesmo que agressiva, deve sempre estar apercebida de elegância. O detalhe nas batalhas, este que é sempre o mais importante, é usar a favor o que foi despejado contra. A maior parte dos versos de Rashid nesta diss é de comentários postados nas redes sociais. Ah, a internet! Ah, o repenet! Ops, o repente.

Ouçam o som e vejam o lyric video, tudo fará sentido:

domingo, 20 de novembro de 2016

Coisas que eu já vi e ninguém fez. Aliás, que eu já fiz e ninguém viu. #1

Quando eu comecei a fazer música, classificada como rap, todo mundo dizia – meu pai inclusive – isso aí não vai dar certo, simplesmente porque era rap. Depois que Ney Matogrosso gravou uma música minha, meu pai voltou atrás sobre “não vai dar certo”; a rapaziada do rap continuou, até hoje continua, com o tal “não vai dar certo”, por causa do meu vocabulário e referências literárias. Ainda ouço dizerem que meu som não atinge a periferia e sou chamado de playboy por conta disso, por conta da minha linguagem. Aí hoje temos Emicida, um dos maiores nomes da música rap, que diz assim numa entrevista (quando perguntado sobre as influências dele para começar a fazer o que ele faz hoje, que é rap, né?):

“De repente esses caras começou a pôr o nome de tanta gente nos rap, tanta referência, que eu falei: mano, num tô entendendo nada e eu fiquei curioso, mas num me afastou do baguio, me fez me aproximar do barato. Então eu acho isso, por isso que eu acho que minha música é simples, mas não é óbvia, porque eu gosto que a música comunique, mas eu gosto que a música comunique e tenha um ponto incógnita ali que a pessoa vai ter que levantar a bunda dela e pesquisar sobre o que eu tô falando também.”

Espero que os amigos, a quem eu falei "mermingual", se lembrem de que eu disse isso quando o meu rap foi questionado por ser sofisticado. E Gabriel, o pensador? É ele o retrato de um playboy? Isso é assunto para uma próxima crônica.

Link para a entrevista em que Emicida diz o que transcrevi acima:

segunda-feira, 3 de outubro de 2016

DIREITO DE RESPOSTA

não tenho tudo que amo, nem amo tudo que tenho
tem coisa que eu carrego como um trabalho de engenho
e é por isso que venho
contra discurso tacanho
de um ódio tamanho
com meu revide ferrenho
sinto-me obrigado em exercer tal função
se perguntado se gosto, logo respondo que não
porém não abro mão, mando um direto no queixo
lanço mão do direito, dou a resposta e desfecho

DE VERSÃO A COVER

Este texto é autoral e exprime exclusivamente em sua manifestação os ideais do redator. Eu assino o texto e qualquer boletim de ocorrência que seja necessário.

Há muito discuto a respeito e defendo a produção musical autoral. Essa é uma bandeira a qual defendo veementemente. Colocarei aqui alguns pontos de vista sobre esse tema.
É necessário, antes de qualquer coisa, discutir as situações que permeiam esse universo. Vamos lá. Existem três situações principais a problematizar: quais as diferenças e semelhanças entre versão, cover e tributo?  

Como matéria-prima, alguém deve compor algo. Pronto. Eis o produto: uma canção. Alguém compõe a letra, alguém compõe a música, às vezes a(s) mesma(s) pessoa(s) desempenha(m) as duas atividades. Daí alguém vai interpretá-la, e pode ser que as mesmas pessoas que desempenharam as duas primeiras atividades executem essa terceira. Assim, autores/compositores e intérpretes se envolvem diretamente nos processos de criação e execução da canção.

O que pode acontecer também é alguém que não compõe, apenas interpreta. Há vários casos, muito bem sucedidos, de intérpretes. Vou utilizar o exemplo de Ney Matogrosso, pois é um exemplo bem próximo. Já tive uma canção gravada por ele (Tupi fusão). A canção em questão tem quatro compositores. A letra é minha e a música é de três parceiros de banda. Ney Matogrosso interpretou-a fazendo uso de arranjos próprios de sua banda, porém mantendo as harmonias e melodias da música original, por isso a canção – interpretada por Ney – não é um cover, mas uma versão que ficou bem a cara dele. O cover é quando se executa igual (geralmente sem o conhecimento e/ou autorização dos compositores).

Em se tratando de executar igual, o que mais acontece no circuito de entretenimento noturno é a execução de covers (geralmente sem o conhecimento e/ou autorização dos compositores). Bandas de meninos novinhos, em sua maioria, que fazem eventos tocando covers, por exemplo, de Pearl Jam, Nirvana, Blink 182 etc. É natural que se comece pelos covers, pelas bandas que são influência no início da trajetória, para depois andar com as próprias canções. Acontece naturalmente. Entretanto, acontece também de os meninos novinhos se tornarem marmanjos ainda executando clássicos, músicas que vendem, vendem porque já venderam, porque são clássicas. Esse tipo de banda, a meu ver e ouvir, é banda de baile. De casamento. De formatura.

Outra coisa é, em meio à apresentação autoral, executar duas ou três canções clássicas que influenciam a banda, como uma espécie de homenagem. É diferente. Bem diferente. Há de se pensar também, em se tratando de homenagens, no que vêm a ser os tributos. Tributo é quando se tem uma banda que se dedica a executar, o mais próximo possível, as canções, os trajes e trejeitos, até o timbre da voz de um(a) determinado(a) cantor(a) ou banda específica. Eu conheço uma banda tributo ao Raul Seixas muito boa. Chama-se Cachorro Urubu. Há de se considerar também como tributo quando um artista x deseja prestar homenagem a um artista y, como fez, por exemplo, Zeca Baleiro ao homenagear Zé Ramalho com uma turnê em que ele executava canções do homenageado. Entretanto sem tentar imitá-lo, nos trajes e trejeitos, e executando as canções em versões, leituras, interpretações suas e de sua banda, mas, como já foi falado aqui, mantendo as harmonias e melodias originais. Portanto, é um tributo-homenagem feito com versões das canções originais e aval do autor.

Há também a paródia. Essa é uma técnica muito interessante. Eu adoro! Mas neste texto não me aprofundarei nessa vertente, pois ela é um processo de composição também, mesmo que parta de algo já existente. Em outro momento talvez eu aprofunde esse e outro tema que também merece atenção, que é o caso das versões que são feitas de uma língua para outra. The Fevers, por exemplo, foi uma banda mestra nesse tipo de composição. Sim, composição. A música (harmonias e melodias) se mantém como a original, mas a letra é uma nova, não é uma tradução, o que acaba conferindo à canção uma autoria em sua versão. Abre-se margem a contestação, é claro, mas em outro momento pensarei em esmiuçar isso.  

Pois bem, de forma bastante formal (aqui neste texto) tentei tratar desses temas que me afetam. E de forma bastante irreverente e irônica tratei desses temas em canção. A música se chama Coveiro, uma brincadeira com quem faz cover. Se faz cover é coveiro, pois além de ser um sufixo – eiro – destinado a atribuir características (rockeiro, reggaeiro, funkeiro etc.), aqui ele atribui uma característica àqueles que reproduzem características já existentes: a função de enterrar o autoral.            

segunda-feira, 29 de agosto de 2016

VIDA DESPIDA

continua a vida
conte nua a vida

domingo, 7 de agosto de 2016

ESTÁ

está tua
estátua
estática?

[ALGUM (ESCRIBA] ALGUM)

Eu
queria
escrever
alguma
coisa
Coisa
alguma
eu
queria
escrever

domingo, 10 de janeiro de 2016

SURURU BOM

Henrique, Ney e eu logo após a passagem de som do show que aconteceria...

O final de 2015 e o início de 2016 se apresentaram com uma enxurrada de notícias boas. Enxurrada, o trocadilho não poderia ser mais adequado para o que vem mais à frente neste texto-relato-desabafo.

Este que vos escreve foi agraciado com dois prêmios no final do ano passado, o que possibilitará a realização de duas obras neste ano corrente. Disco novo e um videoclipe de uma música que estará nesse disco. Detalhe: a música que terá um videoclipe é com Ney Matogrosso, e contará também com ele atuando no clipe.

O festival Maceió Verão 2016, festival que vem acontecendo nesta atual gestão municipal todo mês de janeiro, foi anunciado com Ney Matogrosso como atração principal para a abertura do evento. Ótimo! Além de um excelente espetáculo, o disco e o show Atento aos sinais, que vêm circulando pelo mundo desde 2013, conta com Tupi fusão. Vitor Pirralho sendo interpretado por Ney. Que beleza! E isso aconteceria, em praça pública pela primeira vez, na cidade natal deste compositor. Aconteceria...

Eu e Henrique Oliveira, que dirigirá o nosso videoclipe, aproveitamos a vinda de Ney para o festival e programamos uma reunião para apresentar-lhe o projeto, isso um dia antes da abertura do festival, que foi o dia em que ele chegou à cidade. Tudo certo! Fizemos a reunião, ele se envolveu com o projeto, captou nossas ideias e acrescentou mais, como é característico desse artista, que sempre foi ativo e ativista no que faz. Saímos para jantar e nos divertimos bastante com as histórias que nos foram contadas. Ney, “o Brasil necesita un hombre como usted” (essa é uma piada interna com uma das histórias com a qual ele nos privilegiou, morram de curiosidade). Mas é a mais pura verdade. O Brasil precisa de pessoas como Ney. Verdadeiras.

No dia seguinte, por volta do meio dia, fomos à passagem de som, que estava atrasada, mas já foi um show (vide vídeo), e mais uma vez nos confraternizamos e ficamos empolgados com o espetáculo que aconteceria à noite. Aconteceria...   

Da passagem fomos almoçar. Ney dessa vez não nos acompanhou. Eu e meu parceiro Henrique Oliveira levamos a banda para almoçar à beira da lagoa Mundaú, na Massagueira. Demos o golpe fatal nos músicos com a beleza e a culinária locais. Estava nublado, mas eles se deleitaram mesmo assim. Sacha Amback, diretor musical do espetáculo Atento aos sinais, já conhecia a região, pois eu e o meu tecladista, Dinho Zampier, o levamos lá numa outra ocasião. Os demais – Everson e Aquiles Moraes, Dunga, Da Lua, Guilherme Kastrup e André Valle – piraram e encheram os olhos, e a barriga também. Massa(gueira)!

Depois disso deixamos os músicos no hotel, para que eles se aprontassem para o show que aconteceria mais tarde. Aconteceria... Chega! Vamos ao que aconteceu para que o show não acontecesse. Para tanto, farei um breve retrospecto sobre os eventos que vêm acontecendo e a equipe que monta a estrutura de palco em Maceió (não a conheço, mas deve ser a mesma para todos os eventos). No São João do ano passado, um show foi cancelado porque o palco desabou, estava chovendo; dezembro passado, no aniversário da cidade, uma estrutura metálica caiu sobre a cabeça de um funcionário que trabalhava sem nenhum EPI na montagem do palco (vide vídeo); e agora, no Maceió Verão 2016, a estrutura de palco desabou também, no horário do evento começou a chover. A chuva foi torrencial, de fato uma enxurrada, por isso o trocadilho anunciado no início do texto. O pior só não aconteceu, o palco ter caído sobre os músicos e/ou sobre o público, porque a estrutura de iluminação, que pertence à equipe de Ney Matogrosso, e que por ela foi montada, segurou a estrutura que cedeu do palco, que foi montado pela equipe local, provavelmente a mesma que vem fazendo todos os eventos da prefeitura.  

Resultado: show cancelado! É, o show que aconteceria não aconteceu. Será que o fator principal foi a forte chuva? É inquestionável o poder da natureza, mas a tragédia já era anunciada pelo histórico dessas montagens de palco mal feitas, que são sempre montados, sem exceção, no dia do evento. É um absurdo ter uma passagem de som enquanto as estruturas de palco ainda estão sendo montadas. Como se vistoria um palco antes de um show ser realizado se ele só termina de ser montado momentos antes das apresentações? Eu, particularmente, acho bem interessante a política cultural desta gestão municipal, não me lembro de outra que tenha valorizado assim esse setor, a realização de eventos, o cuidado com a história da cultura local, a realização de um edital de incentivo às artes – a propósito, foi através dele que ganhei os dois prêmios mencionados no início do texto -, mas há de se repensar essa “parceria” com quem fornece e monta as estruturas desses eventos, rever essas contratações, tornar claro o que acontece nas licitações que levam ao perigoso clichê “o barato sai caro”. É necessário sair dessa lama, a transparência urge, o Brasil precisa de pessoas verdadeiras como Ney, que, assim que chegou ao hotel, me ligou num misto de preocupação e indignação: “As pessoas precisam saber a verdade, o que aconteceu. Poderia ter sido uma tragédia!”. Haviam anunciado que o show seria adiado para o dia seguinte, mas quase instantaneamente, através daquele telefonema, eu, ainda no local do evento, entendi que não haveria um adiamento, mas um cancelamento.

Lembro que uma frase dita por Dunga, baixista da banda de Ney, no almoço na Massagueira, quando explicávamos que o sururu bom é aquele que cresce profundamente imerso na lama, vem bem a calhar nestes momentos. Ele concluiu: “Então sururu bom é o que chafurda”. Pois bem, levando em consideração que alguns dicionários definem a palavra ‘sururu’ como briga, desordem, confusão, é bom que o sururu que chafurda seja apenas o molusco, pois, se os gestores continuarem a chafurdar em suas licitações e parcerias, o sururu vai crescer, mas não será o sururu da lagoa Mundaú, e sim o sururu dos dicionários.